Texto escrito para o jornal “O Cometa Itabirano”, especial Carlos Drummond de Andrade, outubro/2012.
Wir Caetano, 10/10/2012
Wir Caetano
Foi ainda adolescente, eu sentado entre outros adolescentes sob a tutoria de um douto ex-seminarista, que um Andrade das letras me visitou pela primeira vez. Era em meados dos anos 1970, e li um poema chamado “As Três Graças”, bacana, que escrevi inspirado pelas ousadias e galhofas do paulista Oswald.
Eu entrara prum grupo de jovens e não tão-jovens que se iniciavam em verso e prosa com um professor dando as cartas e puxando outras, mais precisamente puxando as cartas que eu tinha na manga. Na manga, além de Oswald, eu tinha o senhor Carlos Drummond de Andrade, que o ex-seminarista detestava.
“É por causa de gente como Carlos Drummond, que uma poetisa boa como a fulana fica na sombra”, disse o professor um dia, enquanto retirava qualquer atenção de minha poesia torta, guache naquele bairro um tanto operário, ou nem tanto, de João Monlevade.
Reuniões a fio, o professor foi me detestando cada vez mais, até me detestar de vez, como detestava o itabirano Carlos Drummond de Andrade.
Cada vez mais, eu e o itabirano ficávamos mais próximos um do outro, pra trocarmos nossas confidências (as itabiranas dele, as monlevadenses minhas).
Tão próximos ele e eu, que até algumas pessoas nos confundiam. “É o Drummond da geração dele!”, disse um alguém sobre mim ao falar de poemas meus a amigos, numa noite de gafieira e bebedeiras em Belô, nos anos 1980. Era nada. Magrelo e esquisito como Drummond eu era mesmo. Mas poeta como ele, aiai!
Mas, mesmo não sendo assim aquele Drummond de Andrade, eu me amparava no itabirano, sim, já que meu espírito era assim, torto, e um bom jeito de não ir ladeira abaixo – e pobrezas abaixo nesse mundo de doutos e solenidades – era me amparar num ombro amigo, mesmo que de um cara um tanto esquisito.
Tão esquisito como eu. Tanto que o itabirano tinha lá seu tanto de pontual funcionário público e se, como eu, odiava homenagens à sua magra pessoa – e nem voltava a Itabira pra não ser recebido com carro de bombeiros e foguetório -, não abria mão de alguma homenagem aos bens e ao sangue. Vejam isto:
“Segundo Carlos Cruz [diretor do jornal ‘O Cometa Itabirano’], o poeta chegou a lhes pedir um lobby para atribuir o nome de seu pai, Carlos Paula Andrade, a alguma rua. A solução da prefeitura foi bastante doméstica: dividiu a avenida Carlos Drummond de Andrade em duas, renomeando uma das metades com o nome do pai do poeta.”
Essa confidência entre aspas está numa matéria minha publicada em 18 de outubro de 1998 num jornal belo-horizontino. O poeta, vejam só, queria seu pai de volta a Itabira.
Entender? Gente torta é assim mesmo.